As redes de apoio femininas existem há muito tempo e vêm crescendo cada vez mais. Elas garantem que as mulheres possam ter por perto pessoas e lugares de acolhimento, auxílio e proteção, baseados nas necessidades de cada uma. E as vantagens das redes de apoio são inúmeras, indo muito além do ajudar e do ser ajudada.
De acordo com a psicóloga Luciana Negrão, as redes de apoio estão ligadas a sentimentos de pertencimento, ao desenvolvimento de competências e melhor qualidade nas relações. Isso porque, a despeito dos papéis afetivo e de sanar dificuldades, elas contribuem para o senso de organização, a distribuição de tarefas e o desenvolvimento de responsabilidades.
“Uma rede de apoio, além de ajudar a solucionar problemas, a sanar necessidades, pode despertar a busca pelo crescimento, pela superação de obstáculos, pelo alcance de objetivos pessoais, profissionais, espirituais e assim transcender, que também é uma necessidade humana”, pontua a psicóloga.
Os grupos são a materialização da força e da capacidade das mulheres, que encontram nesses ambientes – sejam presenciais ou virtuais, familiares ou profissionais, voltados ao lazer ou ao empreendedorismo -, lugares em que estão a salvo para compartilhar, escutar, falar e expor-se com todas as suas vulnerabilidades.
Redes de apoio na prática
É criando e/ou participando de redes de apoio na prática que as mulheres veem o poder que existe em se organizar para construir um mundo melhor, mais justo e igualitário, em que elas são protagonistas de suas histórias. Conheça abaixo duas experiências bem-sucedidas de redes de apoio voltadas para mulheres.
Sisterwave
A Sisterwave é uma comunidade online premiada internacionalmente que conecta mulheres que querem viajar a outras mulheres no destino escolhido, em que todas são chamadas de “sisters” (irmãs em inglês).
Através de uma plataforma própria, uma sister pode contatar outra através de um chat, participar de grupos de interesse e buscar e/ou oferecer serviços de viagem entre mulheres, relacionados a hospedagem, tours e passeios, além de dicas do local sob uma perspectiva feminina, que possui sutilezas e vieses que normalmente passam despercebidos aos homens.
“Viajar é a forma mais deliciosa que eu conheço de empoderamento feminino. A criação da Sisterwave é fruto de todo um repertório de estar rodeada de redes poderosas de mulheres. Desde seu nascer vejo a potência de uma rede de apoio para a mulher viajante. E, quando uma toma a coragem de viajar sozinha, ela não só fala para si que é possível, mas mostra para outras mulheres que elas também podem”, ressalta Jussara.
E a força da Sisterwave está justamente em mostrar para as mulheres que elas realmente podem viajar sozinhas com segurança e tranquilidade e que existe uma rede para dar-lhes todo o suporte necessário e tornar a experiência ainda mais enriquecedora: “Diversas mulheres que nunca viajaram sozinhas antes viram na Sisterwave uma possibilidade de começarem a fazer isso. Para mim, como CEO e fundadora, é uma grande felicidade apoiar mulheres a se sentirem mais livres e a viajarem mais”, define Jussara.
Leia Mulheres
O projeto Leia Mulheres nasceu em 2014, quando a escritora inglesa Joanna Walsh publicou a hashtag #readwomen (#leiamulheres, em inglês). No Brasil, a primeira iniciativa se deu em São Paulo, em 2015 e, desde então, mais de 100 coletivos gratuitos, fora do contexto acadêmico e propondo a leitura de obras de valor acessível e que garantam representatividade foram criados pelo país.
Em Cascavel-PR, a iniciativa do Leia Mulheres foi criada em 2019 pela cientista social e professora Juliana Matos pela jornalista Regina Krauss, que reforça a necessidade do projeto: “A proposta de pensar na invisibilidade das mulheres na literatura apontou para a relevância de um tema que vinha sendo esquecido sistematicamente: mulheres são menos publicadas, estudadas e recomendadas, são menos incentivadas a escrever e a viver de seu trabalho”.
E, combatendo essa invisibilidade, o Leia Mulheres Cascavel conseguiu unir pessoas de todas as idades, gêneros e etnias em torno da literatura feminina e, desde seu início, conquistou um grande e fiel público.
“Ainda que falar em grupos de leitura em 2021 pareça uma coisa meio antiquada e nem um pouco cool, os encontros mostraram que existe urgência no diálogo, na troca, na construção coletiva de conhecimento e de repertório. Acredito que muito além das leituras e do incentivo para que as mulheres tenham, nas palavras de Virginia Wolf, um teto todo seu, precisamos de espaços de escuta ativa, respeitosa, nos quais somos ouvidos apesar das diferenças”.
E, de acordo com a jornalista, os frutos colhidos através dessa rede, vistos através dos relatos dos participantes, vão desde o grupo ser suporte que auxilia no crescimento de projetos pessoais até o “deixar de escutar um pouco a voz da impostora que nos diz todos os dias que somos incapazes e insuficientes. Para nós, que mediamos e fazemos a curadoria das obras, isso tudo é mais que suficiente”.
As mulheres fortes
Infelizmente, muitas mulheres descobrem as redes de apoio apenas na vida adulta, visto que cultural e socialmente, mesmo em ambientes familiares e escolares, a individualidade, a competitividade e a concorrência entre as mulheres são muito mais difundidas do que a colaboração, a união e a parceria.
“Nossas divisões internas, nossas disputas e concorrências serão sempre usadas contra nós. Alguém, que não somos nós, está se beneficiando do nosso isolamento, desesperança e sucesso individual. As redes de apoio e a troca de informações, dicas, leituras e acolhimento entres as mulheres é essencial”, evidencia Regina.
A psicóloga Luciana Negrão também aponta para a mesma direção: “A indústria da beleza e estética, os padrões físicos, além de beneficiarem o mercado de produtos e serviços relacionados, também aprisionam, minam as forças, devastam a autoconfiança, promovem a crença de uma felicidade individual, da competitividade”.
Justamente por isso, crescer rodeada de mulheres fortes, que conhecem o poder que a união e a cooperação possuem é fundamental para inspirar, desenvolver noções de solidariedade, coragem, apoio e empatia.
“Acredito que todas podemos aprender com nossas mães e avós e com histórias e lutas das mulheres que vieram antes. Dá-nos perspectiva e esperança. No meu caso, a maior lição aprendida com minha mãe e irmãs é a coragem e o senso de justiça. Fui criada recebendo o mesmo tratamento dos meus irmãos homens, sem papeis de gênero que me fizessem acreditar que não deveria estar em certos lugares ou ir sozinha onde eu queria. Também tive a sorte de não ser cobrada por padrões de beleza impossíveis e ganhei alguns anos sem pensar nisso. Estes aprendizados são tão profundos que sei que estão comigo mesmo quando não estou prestando atenção, dando-me coragem”, relata Regina.
A CEO da Sisterwave, Jussara, também cresceu com mulheres fortes: “Venho de uma família de muitas mulheres e que me inspiram bastante. Sou a mais nova de três irmãs. Aprendi desde cedo o que é sororidade através da cumplicidade e da amizade com elas. Minha mãe é uma grande referência de coragem, empoderamento e determinação. Ela me ensinou muito sobre o cuidado, sobre poder apoiar outras pessoas, mesmo com pouco”.